Chegada! |
No período em que estiveram em Milão, divulgaram a Odin Week Festival. Me inscrevi. Coincidentemente seria em agosto, período em que a Università degli Studi di Milano Bicocca, onde fiz meu período sanduíche, estaria de férias. Fui selecionada. Com meu parco cofrinho de economias e o generoso empréstimo de um amigo paguei o curso em euros !! Quem tem amigos queridos tem tudo!
Mas a Dinamarca... Eu não sabia que era tão longe! Lá faz frio no verão! Para chegar até a cidade de Holstebro, onde fica a sede do grupo, peguei um vôo de Firenze até Copenhagem, com escala em Zurique, era o jeito mais barato, esperei 5 horas no aeroporto para o horário do trem até Fredericia, depois até Herming e de lá um ônibus até Holstebro. Fiquei no Danshostel, (o melhor hostel que fiquei) porque não tinha vôos e horários que dessem prá chegar no dia do início do curso. Assustada com a Dinamarca, me sentindo infeliz com o frio, praticamente com a mala que tinha ido prá Sardenha ( tipo assim: biquíni, chapéu, protetor solar, shorts e dois moletons de ensaio) estranhando a comida, desenferrujando meu inglês, fazendo contas de euros para coroas dinamarquesas e quase tendo um infarto com o preços, fiquei um dia e meio até conhecer meus primeiros colegas de Odin Week: Anna e Lúcio: brasileiros e Luz, que é colombiana.
Os encontros foram muitos. São quase 60 pessoas de várias partes do mundo: Islândia, Tailândia, Colômbia, México, Canadá, Inglaterra, Itália, argentina, França, Bélgica, Estônia, Turquia, Dinamarca, Romênia, Espanha, Egito, Coréia do Sul, Peru, Estados Unidos e Brasil.
Todos nós! |
De 12 a 21 de agosto ficamos juntos na sede do Odin que tem alojamentos. Sensíveis e delicados prepararam o espaço com delicadeza para nos receber, flores na mesa de refeições e enfeites nas árvores da entrada.
A programação foi muito intensa, encontros com Eugenio Barba de uma hora todos os dias, trainings com os atores, vídeos, demonstrações de trabalho, espetáculos todas as noites. No segundo dia, no training com Augusto Omolú, machuquei feio um dedo do pé do tipo acho mesmo que luxou ou quebrou...Zica! Nem é a primeira vez, tenho o pé direito meio já mal tratado. Fiquei um pouco triste, mas segui em diante, a minha lida é essa, dureza conseguir fazer teatro!
Fiquei cansadíssima! Curso em inglês. Sensível e mexida com os espetáculos, com a história do grupo e com muitas imagens que me apareciam tentando lembrar de onde conheci o Odin ou ouvi falar deles a primeira vez. A pergunta que Eugenio nos fez no primeiro dia.
Uma foto "roubada" durante o training com Roberta Carreri. |
Vivia ali momentos de transformação tão profundos e intensos que ainda estou completamente envolvida com essa experiência.
Quem é Eugenio Barba? A palavra generosidade o define bastante bem.
E eu que imaginava poder pesquisar enquanto estaria lá...Mas mal dava tempo de ir ao banheiro, de conversar com pessoas interessantes e participar das festas!
Acordávamos todos os dias as 6:45 para tomar café e como as tarefas eram divididas quem tinha que preparar o café tinha que acordar antes ainda. O pessoal corria com o Kay e eu não pude já expliquei porquê! Aff...
Mas consegui visitar o Samarkand (CTLS) num dos períodos em que fiquei um pouquinho de molho, e lá fui super bem recebida pela Valentina e pela Francesca. Eles são assim super generosos e compartilham mesmo o acervo.
Centro de estudos para teatros laboratórios Odin, Living Theather e Grotowiski |
Da minha cabeça não saem palavras de Eugenio sobre a história do Odin; a discussão dele com Tag Larsen; o vídeo dele recebendo o prêmio em Cuba e com força desfazendo o ramalhete de flores que lhe deram para depois entregar, com os olhos brilhantes, uma parte para cada um dos atores e atrizes do grupo; Roberta Carreri na demonstração de trabalho sobre “Casa das Bonecas” que fazia com Torgeir Wethal, seu companheiro, falecido há um mês e o passarinho que entrou no teatro e parecia entender o que ela dizia, os pássaros são o símbolo da alma humana eu pensava e aquilo que poderia parecer uma coincidência era para mim, na verdade, a profunda comunicação ritualizada daquele espaço sagrado e sobre esse episódio tão delicado tem o artigo do jornalista Carlos Gil http://www.artezblai.com/ ; o espetáculo “Ode to progress”, “Itsi Bitsi”, o “Orô de Othelo” com Augusto Omolú e “En esqueleto de la ballena”, no qual achei que iria ter um treco! Via coisas, sentia um abismo abrindo em mim, descobri mais sobre mim naquele momento do que em anos de terapia...;Ah! Mas e “O livro de Ester”... A delicadeza como nunca antes eu vi...;E Elsie Marie? Ela ao encontro dela mesma na foto...; E o sensível projeto Madalena da Julia Varley e suas criações com a Morte? E o que é uma produtora como a Anne Savage? E a emoção de dançar Oxum num ataque de banzo... Sem falar na cidade de Holstebro, na Dinamarca e no mar do norte...
Dias de se emocionar e muito. E de rir também, com meus colegas do mundo todo, na tentativa de nos comunicarmos em inglês, italiano e espanhol.
E ainda de pensar: no jeito que tenho feito teatro e de como são os modos de produzir teatro no Brasil. Que triste constatação, quanto abandono! Como somos fortes, incríveis: heróis, essa gente do teatro!
Além das muitas experiências, eu trouxe duas pedrinhas do mar do norte que é prá ajudar a continuar a construir o meu desejo de fazer teatro.
Olho prá elas agora e peço aos deuses do teatro que não me deixem esquecer a lição fundamental de Eugênio Barba e seu grupo: que somos nós quem construímos nossos caminhos acreditando no que fazemos, disciplina é liberdade, método é expressão e um grupo de teatro é sinônimo da sociedade na qual acreditamos e gostaríamos de viver!